Jantar às escuras: uma experiência inesquecível!

03/10/2010 15:52

Notícia publicada na edição de 02/10/2010 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 4 do caderno D - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.

 

 

Já imaginou entrar em um restaurante com os olhos vendados, sentar à mesa sem enxergar nada e esperar o jantar sem sequer ter conhecimento do que vai comer? Os organizadores do 2º Encontro Pela Inclusão - Colorindo caminhos mais acessíveis promoveram na cidade um jantar às escuras que teve como objetivo sensibilizar os presentes para as dificuldades sentidas pelos deficientes visuais em atividades rotineiras como ir a um restaurante. A ação antecedeu uma série de palestras sobre o tema, no Grand Hotel Royal, no último dia 17. A coluna Presença foi convidada para participar do jantar que proporcionou uma vivência bastante diferente.

 

De olhos bem vendados

 

Na correria do dia-a-dia, muitas vezes acabamos apreciando a comida mais com os olhos do que com o próprio paladar. Como não era possível comer com os olhos, o jeito mesmo foi aguçar o paladar e o olfato. Chegar ao restaurante com os olhos vendados foi um pouco desconfortável em um primeiro momento, mas logo foi possível ter controle da situação. Nesse sentido, a ajuda de profissionais e voluntários da Asac (Associação Sorocabana de Amparo aos Cegos) foi imprescindível. Sem ter noção do ambiente ,que acomodou cerca de oitenta pessoas para jantar, fui orientada a ocupar meu lugar à mesa. O fotógrafo Erick Pinheiro acompanhou a movimentação no local também de olhos vendados, inclusive fez algumas fotos sem o recurso da visão. Na mesma mesa nos acompanharam quatro participantes. Trocamos impressões e só fomos conhecê-los, visualmente, no final do jantar. Enquanto conversávamos, o garçom se aproximou com o primeiro prato, um mix de saladas. Confesso que foi difícil movimentar os talheres e levar o alimento à boca (as folhas caíam para fora do prato). O segundo prato foi servido de arroz, filé mignon ao molho madeira, legumes e purê de batata. A sobremesa, musse de maracujá. Os cardápios eram informados aos participantes na medida em que chegavam à mesa. E a partir daí, da-lhe olfato e paladar!

 

Tem alguém aí?

 

Outro grande desafio da noite foi tentar chamar a atenção dos garçons para solicitar o serviço. Os participantes foram orientados a levantar a mão quando quisessem estabelecer contato com os profissionais. Sem ter noção da movimentação, a ideia era erguer a mão e esperar: não era possível saber se alguém já estava vindo em sua direção ou se ninguém tinha notado sua manifestação. O jeito foi ter paciência.

O volume de voz também parece ser outro quando lhe é tirada a referência da visão. A sensação que tive é que todos passaram a falar mais alto.

Em meio a tantas novas informações, o tempo pareceu passar rápido e em pouco mais de uma hora já tinha jantado.

Ao longo do jantar, deu vontade de tirar a venda por várias vezes, mas me contive. O fotógrafo também. No final do jantar, já com os olhos desvendados, pudemos ver os que também estavam no evento. Todos ali participaram pela primeira vez de uma ação como essa e muitos não conseguiram ficar com os olhos fechados até o fim.

 

Perder o controle

 

Para a psicóloga Lucimara Pereira Felício, coordenadora técnica da Asac, que também provou da ação, a experiência foi desafiadora. Vendar a pessoa para uma atividade mais longa é complicado. Foram poucos os que conseguiram chegar até o fim, comentou. É difícil até pelas emoções que a situação causa, de repente você perde o controle de tudo, você se torna impotente, dá mesmo um certo desespero, colocou.

Lucimara conseguiu cumprir o objetivo até o fim e contou que sentiu mais vontade de comer. Não tive noção de parar, eu tinha que comer o que me deram, disse. A psicóloga comentou também sobre o comportamento dos participantes.Teve gente que ficou muda, se isolou; outros falaram mais alto. Cada um reagiu de uma forma diferente, relatou.

Toda a renda do evento foi destinada à Asac. A associação tem intenção de promover mais jantares como esse na cidade.

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Comentários

  • IVONE L C DA SILVA [ 02/10/2010 ]

    Parabéns a Mirian, Vinícius e Leandro que organizam há dois anos este evento (e outros virão com certeza). A inclusão é um desafio que precisa ser vencido,e eventos como este é um importante ponto de partida para uma junção de forças e apoios educativos que os integrem como cidadãos desenvolvendo sentimentos de respeito, compreensão e solidariedade . Que a inclusão seja uma realidade e com qualidade.